TRANSPLANTE DENTAL: REQUISITOS E
TÉCNICAS CIRÚRGICAS Bárbara Motta de Paula; Aurélio Ferreira Braga
Disciplina Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial UNIVERSO
1/7/2007
Introdução
Desde o início dos tempos, a substituição artificial de dentes caídos era
efetuada com produtos de origem animal, como o marfim ou o osso, ou com a
extração de dentes da boca de uma pessoa morta. Os primeiros geralmente
eram insatisfatórios, pois absorviam odores e sofriam mudanças de cor.
Quanto aos dentes humanos, estes eram escassos e caros, e a maior parte
das pessoas sentia uma repugnância natural ao colocar um dente de cadáver
na boca. No século XVIII, John Hunter argumentou sobre as vantagens de
transplantar os dentes de um ser humano vivo diretamente para a maxila de
outro ser humano e seu grande prestígio fez com que este duvidoso
procedimento fosse aceito além do conveniente.
O transplante dentário é a substituição de um dente perdido ou ausente por
um dente transplantado, geralmente um terceiro molar, para um alvéolo
preparado ou já existente ocupado pelo dente perdido. O transplante
dentário é uma alternativa de tratamento quando temos a indicação de
extração de terceiros molares, podendo ser usado em um arco que tenha
ausência dentária congênita, por perdas prematuras de molares permanentes,
traumatismos, iatrogenias, perdas dentárias ocasionadas por tumores e
ainda quando o tratamento restaurador protético estiver inviabilizado por
motivos sócio-econômicos.
O momento ideal para realizarmos um transplante dentário é quando seu
desenvolvimento radicular atingiu metade ou dois terços do comprimento
radicular total e o forame apical ainda esteja aberto (Schultze – Mosgau
et al., 1994), porém muitos autores obtiveram sucesso em transplantes
dentários com formação radicular completa, mesmo tendo esse tipo de
transplante um prognóstico menos favorável (Marzola et al.).
Para verificarmos o estágio de formação radicular, uma documentação
radiográfica mínima deverá incluir uma radiografia panorâmica e
radiografias periapicais do dente a ser transplantado e do alvéolo
receptor do transplante. A partir da análise dessas radiografias,
poderemos obter informações importantes para o planejamento do ato
cirúrgico como o estágio de formação radicular, as condições do alvéolo
receptor, informações anatômicas, diâmetro mésio-distal do dente a ser
transplantado e do alvéolo receptor, possíveis patologias no sítio
cirúrgico e outros. Além da documentação radiográfica, devemos realizar
uma criteriosa anamnese para verificarmos as condições sistêmicas e locais
do paciente, se necessário requisitando exames laboratoriais que nos
indiquem que o paciente está apto para realização do procedimento.
Outro fator importante é a explicação do ato cirúrgico para o paciente,
explicitando suas limitações a fim de elucidarmos todas as possíveis
dúvidas que ele possa apresentar, pois apesar de as taxas de sucesso serem
muito altas na literatura, insucessos podem ocorrer e devemos ter a
autorização legal do paciente para a realização do transplante dentário.
Métodos
A principal causa do sucesso dessa técnica consiste no desenvolvimento
tardio dos terceiros molares em relação aos demais dentes (Garn et al.
1962; Gravely et al. 1965; Nicodemo, 1967; Marzola, 1988; Andreassen,
1992).
O ato cirúrgico é muito semelhante à remoção de terceiros molares
impactados, porém uma grande diferença é que o dente transplantado não
pode ser danificado durante a manipulação cirúrgica. O saco folicular deve
ser intocado e mantido no local como um colar a fim de permitir uma melhor
cicatrização do dente transplantado.
A extração dentária deve ser realizada com auxílio de um extrator reto,
através da ação de sarrilho na coroa do dente, evitando-se ao máximo o
contato com a raiz do dente (Marzola, 1988; Marzola e König Jr.,1993) a
fim de evitar o trauma na membrana do saco dental com sérios prejuízos
para o sucesso da intervenção.
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Após a extração do germe dentário, procede-se à limpeza da cavidade e
sutura da região do terceiro molar. A seguir é feito o preparo do alvéolo
receptor. O alvéolo receptor poderá estar presente nos casos onde houve
perda dentária ou precisará ser confeccionado em casos de ausências
dentárias congênitas
Deveremos ter o cuidado de observar se esse alvéolo possui dimensões
adequadas para receber o transplante a partir de exame radiográfico. Caso
isso não ocorra, com o auxílio de brocas, procederemos à adequação
alveolar a fim de apresentar diâmetro mésio-distal adequado, removendo o
septo ósseo, se presente.
Nos casos em que se faz necessária a confecção alveolar, deveremos
preparar o alvéolo compatível com o tamanho do germe a ser transplantado.
É importante lembrar que o procedimento estará contra-indicado quando o
paciente apresentar infecções como lesões periodontais ou endodônticas,
necessitando o paciente, nesses casos, cobertura antibiótica até que sejam
criadas condições para o transplante.
O germe dentário que aguarda em cuba com soro fisiológico ou em seu
próprio alvéolo deverá ser cuidadosamente colocado no alvéolo preparado,
tomando-se o cuidado de manter a oclusão 2mm abaixo da linha de oclusão do
paciente (Marzola; Andreassen). Alguns autores inserem o transplante com o
saco dental completamente abaixo da linha cervical, suturando a mucosa do
saco dental com a gengiva marginal adjacente (Apfel, 1950). Essa manobra
de suturar a mucosa do saco dental com a gengiva marginal tem por
finalidade o reparo imediato desta região. Com isso obteremos melhor
cicatrização local, o que pôde ser observado em um estudo com mais de 300
transplantes de germes de terceiros molares em sua evolução operatória e
pós-operatória superior à técnica utilizada anteriormente que não suturava
essa membrana (Marzola, 1972 e 1988).
Para contenção, posiciona-se o transplante para obtermos uma fixação
estável nas primeiras fases do processo de cicatrização, procederemos à
contenção do transplante que pode ser feita com fio de aço 2-0 ou ainda
com fio ortodôntico 0,7mm nas faces vestibulares do dente transplantado e
dos dentes vizinhos, sendo fixada com resina composta fotopolimerizável.
Essa contenção deverá ser eliminada em um período de 90 a 120 dias, tempo
necessário para a cicatrização do processo alveolar onde, em caso de
sucesso, o transplante não apresentará mobilidade.
A literatura relata excelentes resultados com transplantes dentais quando
o protocolo apropriado é seguido. Andreasen obteve 95% e 98% taxas de
sobrevida a longo prazo para formação completa de raiz de 370 pré-molares
transplantados em 13 anos. Lundberg and Isaksson tiveram sucesso em 94% e
84% dos casos para ápices abertos e fechados respectivamente em 278 dentes
auto-transplantados em um período de cinco anos. Kugelberg obteve sucesso
em 96% e 82% para 45 dentes maduros e imaturos transplantados no incisivo
superior em quatro anos. Cohen1 mostrou sucesso numa media de 98-99% em
cinco anos e 80-87% em dez anos com ápices de dentes anteriores
transplantados.
Nethander obteve sucesso durante cinco anos de 90% para 68 dentes maduros
transplantados com a técnica de dois estágios. Josefsson obteve taxas de
92 % e 82% de sucesso em quatro anos para pré-molares com formação de raiz
completa e incompleta respectivamente.
Estas taxas altas de sucesso são um contraste para os resultados variáveis
relatados em muitos artigos mais antigos. Schwartz e cols padronizaram
taxas de sucesso de somente 76.2% em cinco anos e de 59.6% em dez anos. De
forma similar, Pogrel obteve sucesso em 416 dentes transplantados de 72%.
Contudo, outros investigadores deste mesmo período obtiveram resultados
mais positivos. Kristerson, por exemplo, obteve uma taxa de sucesso de 93%
quando cem pré-molares transplantados em uma média de 6 anos.
Uma vez transplantado e o dente colocado em sua posição final, é checada a
oclusão e se necessário, ajustado com uma broca de alta velocidade. O
dente deve estar em infraoclusão instável para permitir a sua erupção na
oclusão apropriada em alguns poucos meses. Quando apropriadamente
posicionado, o dente pode ser estabilizado com uma sutura por uma ou duas
semanas.
As instruções para o pós-operatório e as seqüelas são similares àquelas
seguidas da remoção de um dente impactado. Deve ser recomendada uma dieta
pastosa e leve por pelo menos dois dias depois da cirurgia e o paciente
deve instruído para evitar a mastigação no local do transplante e que
devem manter uma ótima higiene oral. Alguns pesquisadores acham que o
paciente deve enxaguar o local com clorexidina como adjunto da higiene
oral e também devem submeter-se a ingestão de antibióticos no peri e
pós-operatório.
Muitos profissionais recomendam que o paciente deva ser revisto no dia
seguinte a cirurgia para garantir que o transplante teve a retenção
desejada em sua nova posição, se o splint está estável e a formação de
edema e hematoma estão dentro do padrão de normalidade. O paciente devem
então ser revistos semanalmente por um mês se não houver nenhuma
complicação. Após um mês, o paciente deve ser visto a cada 6 meses durante
um ano. Durante este período o dente deve ser avaliado para verificar o
possível surgimento de colapso pulpar, calcificação intrapulpar,
radiolucência periapical ou reabsorção da raiz. Para transplantes que
visam desenvolvimento do dente com ápices abertos, tratamento endodôntico
do transplante não é necessário, pois, estes dentes podem ser
revascularizados e reinervados. Contudo, o tratamento endodôntico é sempre
necessário para transplantes de dentes maduros com completa formação das
raízes. A terapia endodôntica começa um mês aproximadamente do
pós-operatório com instrumentação dos canais e preenchimento com hidróxido
de cálcio e após 3 a 6 meses após o transplante preenche-se com guta
percha.
Requisitos para o Transplante
As modernas técnicas de transplante dental utilizam preferentemente os
germes dentários por oferecerem melhores resultados a longo prazo, sendo
os terceiros molares os mais indicados para a transferência ao alvéolo do
primeiro molar, devido ao seu desenvolvimento tardio em relação aos demais
dentes.
Alguns requisitos são muito importantes e devem ser levados em
consideração como exigências para o sucesso de um transplante dentário,
são eles: exame clínico e radiográfico, desenvolvimento radicular do germe
dental de no mínimo 1/3 e no máximo 2/3; diâmetro mésio-distal do germe
deve ser igual ou menor ao do dente que irá substituir; germe em posição
favorável para ser extraído, sem ser lesado; boas condições clínicas e de
higiene bucal; interesse em realizar o transplante e colaborar no trans e
pós-operatórios e ausência de lesões periodontais e infecção aguda no
alvéolo receptor.
Para o implante deve-se considerar sua confecção entre outros, o aspecto
psicológico do paciente, situação econômica, podendo ainda ser indicado em
caso de uma extração acidental de um dente são, durante uma intervenção
exodôntica.
A seleção paciente é muito importante para o sucesso do transplante. Os
candidatos devem estar com saúde, e capazes de seguir instruções
pós-operatórias e disponíveis para visitas de follow-up. Devem também ter
um nível aceitável da higiene oral e ter cuidado dental regular. O mais
importante é que os pacientes devem ter um local receptor apropriado e o
dente doador. A cooperação e a compreensão pacientes são extremamente
importantes para assegurar ótimos resultados.
Resultado
Apesar da retenção do dente e da restauração do espaço sem dente ser o
resultado desejado para o paciente, tem sido usado parâmetros mais
específicos para avaliar a sobrevida dos transplantes. Estes parâmetros
incluem fixação periodontal marginal, mobilidade, dor, reabsorção da raiz,
desenvolvimento da raiz, sensibilidade para percussão, profundidade da
gengiva, presença de gengivite e fístula. Todavia, tais estudos são
difíceis de comparar devido a diferentes meios de avaliação utilizados
para determinar o seu sucesso.
A causa mais comum de falha é a reabsorção crônica da raiz. Mais
especificamente, as causas de perda do dente após um transplante desde a
mais até a menos comum podem ser reabsorção inflamatória, anquilose,
periodontite marginal, cáries e trauma. A reabsorção inflamatória pode se
tornar evidente após 3 a 4 semanas, enquanto a reabsorção pode não se
tornar evidente até 3 a 4 meses após o transplante. Ambos os incidentes de
reabsorção podem ser diminuídos com a extração traumática do dente do
doador e sua transferência imediata para o sítio recipiente para minimizar
o risco de lesão do ligamento periodontal.
Apesar do auto-transplante não ter sido estabelecido como um meio
tradicional para substituição do dente perdido, o procedimento garante
mais consideração. Estudos recentes demonstram claramente que o
auto-transplante dental é bem sucedido enquanto colocação de implante
dental. As taxas mínimas aceitáveis de sucesso para implantes de titâneo
são de 85% após 5 anos e 80% após 10 anos. Para pacientes jovens os
auto-transplantes podem ser mais considerados como conduta temporária. O
transplante pode substituir um dente perdido garantindo a preservação
óssea até o crescimento cessar e então, se necessário, o paciente pode se
candidatar aos implantes. Através da seleção apropriada dos pacientes, da
presença de doador compatível do dente e sítio receptor, o transplante
autógeno pode ser considerado como uma opção viável para o tratamento de
um espaço sem dente.
Os fatores que levam ao sucesso têm sido bastante investigados. A
determinante mais significativa para sobrevida dos transplantes é a
vitalidade continuada da membrana periodontal. Nos casos quando esse
ligamento periodontal é traumatizado durante o transplante, a reabsorção
da raiz externa e anquilose é bastante notada. Schwartz tentou ligar a
perda de enxerto a fatores prognósticos específicos e obteve taxas de
sucessos maiores quando o dente do doador é pré-molar, tem metade dos dois
terços de desenvolvimento de raiz, mínimo trauma e limitado tempo extra
oral durante a cirurgia. A experiência do cirurgião também influencia o
sucesso devido a sensível técnica que envolve este procedimento.
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dez. 2004.
1/7/2007
Fonte: www.cispre.com.br
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