Por ser uma disciplina
recente e ministrada em apenas algumas faculdades, a literatura existente
sobre Administração e Marketing na Odontologia ainda está em
desenvolvimento, sendo poucas as pesquisas empíricas sobre o assunto.
Contudo, para que a Administração e o Marketing possam ser reconhecidos como
importantes na área da Saúde, é necessário que se apresentem pesquisas
solidamente fundamentadas para dar credibilidade ao tema.
Esse artigo é um esforço no
sentido de difundir a importância do conhecimento gerencial aos meus colegas
dentistas e desta maneira permitir aos mesmos melhorarem sua capacidade
competitiva nesse mercado tão saturado e sujeito a instabilidades como é o
da Odontologia.
Assunto de minha
dissertação de mestrado em Administração de Empresas, a formação de
parcerias em Odontologia (ou seja, a seleção de parceiros dentistas para que
os clientes façam tratamentos em especialidades que o dentista de origem não
possui) apresenta certas dificuldades em sua implementação e em sua
estabilidade no tempo.
Isso é importante para
nosso dia a dia pois em Odontologia e na Saúde em geral, os tratamentos são
interdisciplinares e complexos, envolvendo freqüentemente várias
especialidades, o que nem sempre uma clínica possui. Logo, precisamos de
colegas que sejam nossos parceiros. Outro motivo relevante é que a qualidade
e força dos relacionamentos entre dentistas afetam o poder de negociação da
classe junto a entidades, fornecedores e clientes.
Em algumas linhas, farei o
resumo da dissertação e dos resultados. Não entrarei em detalhes da teoria,
metodologia do trabalho, modelo desenvolvido ou referências bibliográficas
por limitações de espaço. Para os interessados, há uma versão completa da
dissertação para download em http://www.dr3.com.br/administracao/downloads.php
A PESQUISA
Foram pesquisados 300
dentistas da cidade de São Paulo quanto aos seus critérios de seleção de
parceiros e características das parcerias formadas. A amostra foi
selecionada aleatoriamente por meio do banco de dados do CROSP. Foram
enviadas cartas a 2200 cirurgiões-dentistas e e-mails a 959
cirurgiões-dentistas. Foram criadas 41 variáveis que abordaram aspectos do
funcionamento dos consultórios, como nível de atividade, de indicação e
recebimento de clientes do parceiro, critérios de seleção de parceiros e
características da parceria.
Os dados foram analisados
com o software estatístico SPSS e com o auxílio de uma ferramenta de
inteligência artificial, a modelagem baseada em agentes, representada
especificamente pelos autômatos celulares. Contudo, não entrarei nesses
detalhes por estarem além do escopo deste artigo.
RESULTADOS
A taxa de resposta foi de
9,5%. A porcentagem de respondentes por especialidade é ilustrada no Gráfico
1. A porcentagem representa com relativa fidelidade a proporção real de
cirurgiões-dentistas por especialidade inscritos no CROSP.
Gráfico 1 – Porcentagem
de respondentes por especialidade.
A maioria dos respondentes
está de 6 a 10 anos no consultório atual, tem mais de 6 anos de formado,
oferece de 3 a 4 especialidades no consultório, tem no máximo 2
funcionários, atende de 6 a 12 pacientes por dia, 5 dias por semana e indica
ou recebe 1 a 2 pacientes por semana.
Os critérios mais
importantes para seleção de parceiros em Odontologia são (Gráfico 2): os
hards referentes a coisas tangíveis: complementaridade de recursos,
baixo índice de problemas e repetições de trabalho, proximidade do
consultório do parceiro, preço, condições financeiras oferecidas ao paciente
indicado, qualidade dos equipamentos, das instalações, aparência da equipe
do parceiro e os softs, referentes a elementos intangíveis, pessoais,
como flexibilidade de atendimento, habilidade, honestidade, grau de atenção
individualizada e personalização do atendimento ao paciente indicado. Dentre
esses e para essa amostra, os critérios aos quais é dada menor importância
são o preço e a proximidade do parceiro (em laranja). Os critérios aos quais
é dada maior importância são a habilidade, honestidade, disposição em ajudar
o cliente e baixo índice de repetições de trabalhos (em verde).
Gráfico 2 – Média das
respostas por critério de seleção de parceiros.
A maioria das parcerias é
caracterizada por alto grau de conflito e pouca dependência mútua, o que
interfere na sua durabilidade no longo prazo. O envolvimento dos parceiros
em Odontologia não é forte e os riscos não são totalmente avaliados durante
a formação da parceria, provavelmente devido ao fato que os
cirurgiões-dentistas geralmente não sabem exatamente o que procurar nas
qualidades de seu parceiro. Com isso, apesar da amostra ter em média mais de
6 anos de formados, a média de duração das parcerias é de 4 anos. Ou seja, a
maioria dos dentistas já mudou de parceiro pelo menos uma vez, devido à
insatisfação com o resultado da parceria. Isso é confirmado pelo dado de que
53% dos respondentes afirmam ter tido uma experiência passada negativa com o
dentista para o qual indicavam pacientes.
Esse artigo contribui nesse
aspecto, ao esclarecer quais características o provável parceiro deve
possuir. Apesar dessa dificuldade, os cirurgiões-dentistas percebem que o
estabelecimento da parceria fortaleceu o negócio financeiramente.
Os colegas estão situados
em três classes de profissionais, quanto à seleção de parceiros:
- uma que considera apenas
critérios de qualidade técnica,
- outra que considera
aspectos pessoais como honestidade e habilidade,
- e uma última que está
mais voltada à satisfação do cliente, dado que esta última considera
aspectos referentes ao preço, condições de financiamento ao cliente,
proximidade e flexibilidade do parceiro em relação ao cliente indicado.
Sabendo-se da existência
dessas três classes, pode-se então utilizar esse conhecimento para
selecionar colegas mais afins e com isso aumentar a chance de sucesso da
parceria.
Quanto maior a força dos
relacionamentos entre dois dentistas, mais fácil será o consenso entre eles.
Sendo assim, quanto maior a troca de informação, envolvimento pessoal e
serviços prestados mutuamente entre dois dentistas, mais facilmente o
entendimento aparecerá entre eles, facilitando a comunicação e o sucesso de
empreendimentos conjuntos. Logo, devemos selecionar parceiros que possuam
características que são importantes para o sucesso de nosso negócio e
o sucesso do relacionamento. Não basta o colega ser um bom profissional no
aspecto técnico mas não possuir, por exemplo, ética, pois tal indivíduo pode
se beneficiar da parceria unilateralmente, ao desviar clientes ou propor
tratamentos que são executados pelo dentista de origem, sem que o mesmo
saiba.
Quanto maior a força dos
relacionamentos entre dois dentistas, maior a estabilidade da parceria entre
eles, mas conforme dito acima, a qualidade do relacionamento é apenas um dos
determinantes do sucesso da parceria. Deve-se também levar em conta a
qualidade técnica do parceiro.
Um indivíduo com uma
maneira de pensar diferente do resto da rede onde se situa geralmente faz
com que ele se afaste dessa rede e conseqüentemente tenha rendimentos
menores do que o resto da rede, pela ausência de relacionamentos. Isso
ocorre pois se um dentista fica “trancado” em seu consultório, ele perde
oportunidades de relacionamento e de negócio, bem como oportunidades de
aprendizado técnico. Ficando fechado em seu consultório, os conhecimentos se
tornam obsoletos com mais facilidade o que pode interferir no sucesso do
profissional, pois ele está menos aberto ao mundo externo e a novas idéias.
Sendo assim, ele pode ter limitada a sua capacidade de tomar decisões
acertadas, sejam elas gerenciais ou referentes a aspectos clínicos.
CONCLUSÃO
Assim como as decisões
gerenciais, a seleção de parceiros em Odontologia se dá de forma intuitiva,
o que nem sempre leva a resultados satisfatórios no longo prazo. Havendo,
portanto, uma perspectiva de médio a curto prazo na duração da parceria, uma
alta concorrência no setor e pouca força de relacionamento entre os
dentistas, alguns indivíduos são mais inclinados a efetuarem desvios da
cooperação, o que compromete a duração e a estabilidade das parcerias. Como
efeito final, pode haver uma diminuição na eficiência e qualidade do
atendimento ao cliente, o que pode resultar em sua perda, interferindo na
lucratividade e sobrevivência do negócio.
Agradecimentos
O autor agradece a todos os
300 dentistas que responderam a pesquisa, à banca examinadora composta pela
Profa. Dra. Eliane Pereira Zamith Brito (Administração de Empresas -
Mackenzie), Prof. Dr. Pedro Paulo Balbi de Oliveira (Engenharia -
Mackenzie), Prof. Dr. Eleutério Fernando da Silva Prado (FEA-USP), à CAPES,
ao MackPesquisa e ao CROSP, que viabilizaram a execução do presente
trabalho. |