PROBLEMAS ATUAIS DA ODONTOLOGIA
Antônio Inácio
RIBEIRO (*)
Considera-se ponto
de partida para aplicação do marketing um conhecimento geral da
situação de um determinado setor de atividades. Esta é nossa
intenção ao elaborar este levantamento das dificuldades encontradas
pelo Cirurgião Dentista. O fizemos baseados no contato diário com
estes, em função de nossa atividade profissional, razão pela qual
optamos por uma linha mais descritiva ao invés de seguirmos algum
método fruto de consultas. Os itens abordados não estão
necessariamente em alguma ordem de gravidade ou maior incidência,
muito embora tenham entre si uma lógica seqüencial.
DIMINUIÇÃO DA RECEITA
Indiscutivelmente
este é o reclamo mais presente quando o tema é a situação atual da
Odontologia. Este quadro assume contornos de problema se
considerarmos seu aspecto crônico e a importância que a receita tem
na conta simples do débito/crédito. Esta diminuição reflete uma
queda no número de pacientes somada a uma redução de seu poder
aquisitivo. Até os anos setenta a Odontologia experimenta uma
ascensão que a colocou entre as profissões liberais mais procuradas
pelos adolescentes em fase de decisão por uma carreira. Nos anos
oitenta, conseqüência talvez da
alternância de
planos econômicos bem e mal sucedidos, os consultórios dentários
enfrentaram momentos de altos e baixos, iniciando os anos noventa
com uma nítida curva descendente de receitas, com pequena
interrupção na primeira fase do plano real. O quadro atual,
comparado aos anos setenta é de nítida desvantagem e nenhum
indicador sinaliza mudança significativa de rumos, pelo menos no
tocante aos fatores extrínsecos.
AUMENTO
DOS CUSTOS
No outro lado da
balança, o das despesas, para desespero de alguns talvez hoje
muitos, o quadro é de nítida ascensão. O pior é que os aumentos não
se restringem simplesmente aos custos do material dentário. Envolvem
salários mais altos para atendentes, secretárias e THD’s, além de
custos maiores percentualmente nos valores pagos a protéticos.
Aumentaram também os aluguéis e os impostos, sendo neste item
criados novos que atinge a todos. São maiores os valores hoje pagos
por instrumentos e equipamentos sem contar que as taxas de juros,
atualmente são as maiores de nossa história.
NOVAS
DESPESAS
Alem das antigas e
obrigatórias, a vida moderna tem levado todos a compromissos antes
inexistentes, fazendo aumentar ainda mais o lado das obrigações. São
necessidades tais como celular, fax, computador e Internet, que se
por um lado o beneficiam, por outro elevam seus custos. Há que se
considerar que alguns deles são altamente benéficos (celular),
outros quase imprescindíveis (computador). Soma-se a isto, que a
maioria das novas técnicas requerem não somente materiais novos,como
também novos aparelhos, mais sofisticados e caros. Estas novas
despesas elevam ainda mais o ponto de equilíbrio, momento em que as
receitas empatam com as despesas, fazendo com que o profissional do
nosso tempo trabalhe mais para simplesmente equilibrar suas contas.
PACIENTES MAIS EXIGENTES
A informação que
caracteriza a era da globalização fez com que os pacientes de hoje
saibam mais sobre seus problemas ou tenham onde buscar conhecimento
acerca de tudo, inclusive tratamentos dentários. Não só conhecem
mais, como citam alternativas de tratamento buscando sempre um
melhor serviço. Para tanto, não hesitam em ir atrás de outros
orçamentos, não só por melhores preços, mas também por outras opções
na condição de pagamentos. Além do mais, ao final do tratamento, se
algo não lhe agradou, falam facilmente no Código de Defesa do
Consumidor, fazendo com que o serviço tenha um adicional de custos
por conta de garantias ou repetições. Estes fatores fazem a
Odontologia ainda mais competitiva.
AUMENTO DA CONCORRÊNCIA
Em 1984, quando
dei minha primeira conferência sobre marketing, lembro de ter
comentado que a Odontologia era a mais promissora dentre as
profissões liberais e que só enfrentaria dificuldades de saturação
no mercado de trabalho quando o número de faculdades fosse superior
a cem e que isto só aconteceria depois do ano 2000. Errei feio! Hoje
já são quase 200 no Brasil e o mercado já apresenta sinais evidentes
de saturação. São mais de 10.000 novos Cirurgiões Dentistas
formando-se a cada ano num crescimento de mais de 5%, enquanto nossa
população cresce em torno de 2%. Alem deste quantitativo, há um
crescimento qualitativo que também contribui para aumento da
concorrência: são quase 1.000 cursos de especialização e
pós-graduação em funcionamento no Brasil, o que equivale a
aproximados 10.000 novos especialistas e pós-graduados a cada ano,
fazendo com que algumas especialidades já mostrem sinais de
saturação.
QUEDA NOS VALORES
Mais perceptível
nas especialidades, embora seja um problema também perceptível na
clínica geral, as quantidades de unidades monetárias percebidas
pelos procedimentos odontológicos, experimentam também significativa
queda. Para exemplificar tenho comentado que quando comecei com os
implantes, a primeira matéria mencionava valores falava em R$
4.000,00 e pesquisa que presentemente estamos desenvolvendo indica
incidência de preços entre R$ 500,00 e R$ 700,00 por implante, fase
cirúrgica. Na ortodontia lembro de aproximados R$ 2.000,00 para a
colocação de aparelho e hoje escuto que alguns não cobram a
colocação, restringindo-se a recebimento mensal dos valores de
manutenção que igualmente tiveram significativa redução.
CONDIÇÕES DE PAGAMENTO
Quando iniciei na
Odontologia, em 1972, os valores de tratamento eram a vista. Quanto
muito se pagava metade no início e outra metade no tratamento
concluído. A exceção aos excepcionais clientes, era permitir o
pagamento ao término do tratamento, mas sempre a vista. Pelos anos
oitenta consolidaram-se os pagamentos em três vezes e hoje é normal
acordar-se orçamentos em quatro ou cinco vezes. Os planos
odontológicos que foram febre em meados da década noventa ganharam
força talvez por acenarem possibilidade de tratamento dentário em
quantidade maior de vezes, mesmo que o serviço também fosse prestado
em prazo maior.
CONVÊNIOS E PLANOS DE SAÚDE
Quase não existiam
nos anos setenta, ganharam adeptos nos oitenta e existem cada vez em
maior número nos dias atuais. O atendimento socializado em
sindicatos e grandes empresas é hoje uma realidade na Odontologia e
nada há contra isto. Mas em nível de análise não se pode omitir que
muitos pacientes migraram do atendimento particular para a
Odontologia de grupo, onde muitas vezes o critério quantitativo
supera o qualitativo e mais serem atendidos por menos. Convênios e
emprego são alternativa para recém formados que não sejam filhos ou
parentes de Cirurgiões Dentistas.
PREVENÇÃO E EDUCAÇÃO
Indiscutível que
são o caminho para a saúde bucal assim como com elas certamente vão
diminuir o número de patologias odontológicas, mormente em algumas
faixas etárias fazendo com que em algumas partes do mundo o quadro
de especialidades se altere: na Suécia, Meca dos procedimentos
preventivos, a odontopediatria perdeu espaço para a implantodontia,
sinalizando alteração presente e futura. Os pacientes cuidam muito
mais e melhor de seus dentes do que no meu tempo a ponto de minha
sobrinha, aos 18 anos não ter tido uma única cárie. Alem do que a
aparatologia de higiene bucal é muito mais eficiente e difundida nos
dias de hoje. Numa análise fria de mercado isto significara menos
pacientes no amanhã.
INTERRUPÇÃO E CURSOS
Uma mudança
totalmente decorrente da crise, é a suspensão do tratamento, durante
o mesmo, motivadas exclusivamente por questões financeiras. Antes
fato incomum e de difícil ocorrência, ainda assim com outros
motivadores são agora tão comuns como resfriados, acontecendo com
uma simples mudança no termômetro financeiro do paciente, que é seu
bolso. A desvantagem maior reside no fato de que a retomada é sempre
mais difícil no aspecto motivacional do que o começo do tratamento.
Outra dor de cabeça dos nossos dias é o aparecimento de um
concorrente silencioso e potente que são os cursos de atualização e
especialização (hoje até os de aperfeiçoamento) atendendo pacientes
a preços que se convencionou chamar de custos, que na verdade dentro
de um conceito de mercado mais são vis do que propriamente de
custos, porque na maioria dos casos não atendem pacientes carentes e
sim possíveis clientes de clínica particular.
MAUS
PAGADORES
Lembro bem que
trabalhei quase quinze anos sem receber um único cheque sem fundos e
quando algum problema estava por acontecer sempre recebia antes um
telefonema de participação. Posteriormente, por um período de
aproximados dez anos, os casos com devolução de cheques começaram a
acontecer com mais freqüência, até se tornarem uma constante,
principalmente com cheques de clientes dos nossos clientes.
Recentemente o problema tem diminuído, na verdade trocado por outro
ainda pior: os clientes simplesmente não pagam e desaparecem,
inclusive alguns dos nossos, creio que em conseqüência da fuga dos
seus.
CRISE
Finalmente, no que
cronicamente se convencionou chamar de crise, a maioria acaba
trabalhando mais praticando preços menores para manter o padrão,
aumentando em decorrência o número de pacientes atendidos e em
linguagem técnica antecipando demanda, diminuindo conseqüentemente o
número de pacientes a serem atendidos no futuro.
Fechando esta
nossa seqüência de raciocínio, particularmente lembro que há dez
anos atrás eu gastava dez vezes menos para manter meu padrão de vida
e que hoje não consigo reduzi-los à metade, até para que os sinais
da crise não sejam ainda maiores.
Não foi nossa
intenção criar qualquer tipo de celeuma, muito pelo contrário,
queremos motivar ao estudo do estado atual da Odontologia, suas
alternativas e planejamento para dias melhores, que são e passam por
processos de marketing. Talvez por isso se fale e procure saber
tanto sobre marketing odontológico.
(*) Doutorando em
Marketing pela ULR / Espanha, MBA em Marketing pelo ISAE / FGV,
Especialista em Marketing pela PUC / PR, Pós-graduado em Marketing
pela ADVB / SP, Administrador pela Universidade Mackenzie / SP,
autor de 29 livros, tendo já publicados mais de 800 artigos e
colunas, 200 no Brasil e 600 no exterior, ministrador de 220 cursos
e palestras.
ribeiro@odontex.com.br
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