A crise passou ao largo do mercado de atendimento odontológico, que percebeu pouco impacto negativo na renegociação dos contratos, mesmo diante da tentativa das empresas de reduzir os custos. Quem afirma isso é José de Arimathéa Barcellos, presidente da Dental Plus, uma das maiores empresas dessa área, e que, apesar de ainda ser nova no mercado, já concorre diretamente com a Odontoprev, a líder do segmento no Brasil. Para falar da perspectiva de crescimento de 80% no setor este ano, o executivo participou do programa “Panorama do Brasil”, tendo sido entrevistado pelos jornalistas Roberto Müller, Márcia Raposo, diretora de Redação do DCI, e Nelson Tucci. Acompanhe trechos da entrevista.
Roberto Müller: A assistência odontológica é um serviço relativamente recente no Brasil, e eu gostaria de saber como vai esse mercado. Sua empresa não é uma das mais antigas, mas é uma das que mais crescem, pelo que me foi informado, e é focada basicamente no Grande ABC. É isso mesmo?
José de A. Barcellos: É uma excelente oportunidade para falar de setor odontológico, que vem crescendo muito nos últimos anos, isso falando de 15, 20 anos em relação às empresas e às cooperativas. A odontologia enfrentou uma certa barreira da rede credenciada que são os profissionais, o que na verdade é uma cultura diferenciada em que o profissional não acreditava que se você planejar o seu custo, há como atender uma quantidade maior de pessoas e não deixar que a qualidade fique aí em aberto. Então fizemos um trabalho cultural com essa rede credenciada para que eles aceitassem a proposta oferecida pelas operadoras. Porque no segmento era atendida uma classe social, vamos falar de classe A, B e C. Mas as classes D e E não eram atendidas, e esse foi o grande lance da odontologia de grupo, ela focou esse mercado, acreditou no sistema e hoje estamos atendendo inclusive a classe B, pela questão da rede credenciada qualificada com bom atendimento.
Roberto Müller: Quer dizer, sua empresa trabalha diretamente com as empresas que repassam os serviços aos trabalhadores, é isso?
José de A. Barcellos: Exatamente, a contratação da cooperativa é por um benefício qualificativo no que diz respeito à odontologia e principalmente à autoestima do funcionário. Quando falamos de autoestima, falamos de gente, de respeito ao funcionário, então quem cuida hoje de uma empresa, representa uma companhia, a pessoa que trabalha por uma empresa, ela tem de estar bem pessoalmente, e a questão estética -e principalmente de saúde funcional- tudo começa pelos dentes, pela boca. Então, as empresas começaram a adotar isso como uma [fonte de] autoestima para o funcionário, e esse índice foi aumentando absurdamente.
Márcia Raposo: De agosto do ano passado para cá, a percepção corporativa do negócio teve de se voltar para o foco das empresas, que era vender e comprar. Você sentiu que os planos odontológicos ficaram sem segundo plano para as empresas em decorrência da crise, ou você não sentiu e as vendas continuam de vento em popa? Como foi o impacto dessa crise nessa área -digamos- social que a empresa tem?
José de A. Barcellos: Com certeza todos os empresários reformularam custos, mas a odontologia não foi o item cujo custo eles mais se preocuparam em reduzir dentro de sua empresa. O motivo principal é a autoestima do funcionário: se a empresa tira esse benefício, ela acaba com a autoestima dele. Existiram algumas empresas que por necessidade, tiveram de reduzir os custos. Então nós entramos com uma negociação, porque existem dois tipos de contratação, aquela que é feita por adesão e a compulsória. Normalmente, a empresa que solicita uma redução de valores faz isso porque é contratada compulsoriamente. Desta maneira, entramos em uma negociação com estas empresas para conseguirmos ligar a questão da autoestima com a opção da adesão, mantendo-se os valores, e os funcionários puderam dar continuidade ao atendimento odontológico na rede credenciada.
Márcia Raposo: Mas você chegou a ter corte de volume de contratos ou vocês conseguiram renegociar todos?
José de A. Barcellos: Conseguimos renegociar os contratos. Nós tivemos entre 5% a 10%, mas é um volume muito baixo de corte, em relação a outros mercados. Mesmo porque eu sinto que houve sim, reduções, mas em minha opinião no Brasil a crise ao foi tão violenta como está sendo aí afora. Porque o brasileiro é um povo muito criativo, inclusive as pessoas dessa classe nossa, dos odontólogos. Nós já passamos por um processo anterior muito ruim, e acho que, depois de enfrentar tantos processos, nós acabamos passando por isso com uma certa tranquilidade.
Nelson Tucci: Segundo a Agência Nacional de Saúde Complementar, cerca de 52 milhões de brasileiros são conveniados a planos de saúde médica, os odontológicos devem estar na casa de 10% desse valor, ou um pouco mais, eu gostaria que você nos passasse esse número. Eu gostaria de saber se esse crescimento dos planos de saúde odontológica se deve a uma conscientização maior das pessoas, ou das empresas -que precisam repassar esse benefício aos funcionários porque isso vai reverter em uma produtividade melhor e maior- ou se se deve ao fato de as empresas do segmento odontológico terem sido mais agressivas. A que se atribui o crescimento dessa modalidade no País?
José de A. Barcellos: A assistência odontológica, vamos falar no ano de 2000, nos estávamos por volta de 2 milhões de atendimentos para os usuários da odontologia. Hoje, nós estamos, segundo dados do Sindicato Nacional de Odontologia de Grupo, com 11 milhões de atendimentos.
Roberto Müller: O número de conveniados é bem menor do que o dos planos de saúde médica.
José de A. Barcellos: Isso prova que nós temos muito trabalho pela frente. A questão é que as empresas colocam, como benefício primeiro do tratamento odontológico, a autoestima: elas verificaram e analisaram e concluíram que realmente este benefício existe.
Nelson Tucci: Então no seu processo de vendas, de fomentação de novos negócios, a empresa, a indústria e os serviços, são seus grandes aliados.
José de A. Barcellos: Sim, nós trabalhamos no mercado de planos voltados a pequenas e médias empresas, de até 99 vidas, porque acima de 100 vidas passa a ser um plano empresarial. Naturalmente nós temos um valor congelado do plano de pequenas e médias e um valor empresarial. E uma outra consideração é a de como o mercado cresce. O custo é muito pequeno em relação ao benefício. Hoje em média no mercado, o tíquete médio mensal é de R$ 10 per capita.
Roberto Müller: Isso é compensador para os odontólogos?
José de A. Barcellos: Isso bate de frente com aquela primeira questão que eu coloquei, a da rede credenciada. Até hoje alguns profissionais realmente deixam um pouco a desejar em relação ao sistema de operadoras de odontologia. Porque a tabela nossa de repasse para o profissional não é a mesma que ele cobra enquanto profissional particular. Na nossa tabela, eu vou passar um valor por procedimento. Por exemplo, no caso de uma restauração de amálgama, hoje um profissional cobra entre R$ 50 e R$ 60 por esse procedimento em uma face do dente; mas quando falamos em operadora, ela trabalha com uma margem de R$ 8 a R$ 16 de pagamento por esse procedimento. Então ele não quer trabalhar com esse valor. Mas quando fazemos uma avaliação do custo de uma obturação de amálgama, ela custa R$ 8 para o profissional. Então o que ele tem de valorizar, ele tem de ver que realmente o custo dele se paga. Então ele tem de ver que realmente o custo se paga. Agora essas operadoras estão levando os clientes a esse profissional. O tem ele tem de fazer é aproveitar as oportunidades, pois dentro das normas estipuladas pela Agência Nacional de Saúde (ANS), que regula nosso sistema, existem procedimentos -como implantes, próteses e clareamento- que não estão previstos dentro dos planos. Assim, se o profissional for criativo, ele vai conseguir mais negócios ao aproveitar os clientes que as operadoras estão levando até ele.
Roberto Müller: Com os custos dos procedimentos básicos, comparado ao que o odontólogo recebe, que vantagem ele tem em se credenciar?
José de A. Barcellos: A vantagem principal é que ele recebe um grande volume de clientes para serem atendidos, sendo que ele tem que usar a criatividade dele nos procedimentos dos quais não há cobertura, porque ele consegue alavancar a receita dele a partir desses procedimentos não cobertos por nós, que o cliente vai pagar. Parto do seguinte princípio: se sou odontólogo, tenho meu consultório, e estou com dificuldades de atrair clientes, uma forma bacana que eu adotaria é a contratação de uma operadora de odontologia de grupo. Com isso o cliente vem até o meu consultório e a partir daí eu uso a minha criatividade. Quando eu citei de R$ 8 a R$ 16, o valor mínimo é R$ 8, ou seja, ele empataria, mas se partirmos do princípio de que a operadora trabalha com um volume maior, ele já está ganhando com isto. E ao mesmo tempo ele está aumentando essa receita, dando giro ao negócio dele. Hoje a maior dificuldade que o profissional tem é de atrair o cliente, essa é a maior dificuldade.
Márcia Raposo: Sabemos que praticamente metade dos serviços odontológicos do Brasil está aqui, no Estado de São Paulo. Mas se olharmos o perfil econômico do País nos últimos cinco anos, vemos uma expansão bruta do nordeste como mercado de consumo em geral, não só de produtos, mas também de serviços. A grandes operadoras de serviços, como a sua, do setor odontológico, pensam em uma expansão nesses mercados que avançaram economicamente? É um investimento muito grande? Ou vocês ainda estão muito vinculados a atender o Estado de São Paulo?
José de A. Barcellos: Estrategicamente é muito interessante você trabalhar com os outros estados. Realmente os números demonstram que o nordeste ainda é um universo pequeno, por volta de toda a região está na casa dos 20%. Muito abaixo de São Paulo, por exemplo, que é de 50% a 60% de todo o serviço odontológico. Existe sim, potencial no nordeste, depende de cada operadora adotar sua estratégia para obter esse crescimento. Obviamente, isso vai gerar um aumento de investimento, mas é interessante que a gente faça um trabalho em toda a região. Na verdade a gente acompanha as empresas. No nosso segmento, tudo começou em Santo André (SP) e nossa sede é lá, mas o nosso atendimento é nacional, e demos início a essa cobertura nacional por meio das empresas de Santo André que têm filiais em outros estados. Obviamente quando você começa a atender fora do seu estado, criam-se novas estratégias de crescimento nos outros estados.
Roberto Müller: Como é esse mercado? São as operadoras que procuram mais os odontólogos, ou vice-versa?
José de A. Barcellos: Em um primeiro momento, as operadoras foram atrás dos odontólogos, e ainda continuamos com o mesmo sistema, indo atrás destes profissionais, porém aumentou bastante a procura dos profissionais pelas operadoras.
Roberto Müller: A operadora adota algum critério na escolha dos odontólogos, seja de densidade regional, seja de qualidade e equipamentos?
José de A. Barcellos: Existem critérios. Hoje você tem atendimentos diferenciados, em níveis de diretorias, gerenciais e operacionais. Você monta essa rede credenciada em cima da necessidade da empresa. Mas, com certeza, e independentemente de qualquer atendimento do quadro de funcionários, primeiro vem a avaliação do currículo do profissional, depois a localização e por fim a infraestrutura de atendimento dele, passando pela capacidade de absorver a demanda. E nós sempre respeitamos a rede credenciada e o profissional em números de atendimento. Quando nós percebemos que o número de pessoas a que atende está ultrapassando, ou está fora da nossa necessidade, daí sim, nós procuramos um profissional próximo, para podermos credenciá-lo.
Nelson Tucci: A economia brasileira não tem um comportamento homogêneo, alguns setores tiraram o pé do acelerador, outros crescem de uma forma vegetativa e outros vão muito bem. No seu setor, o odontológico, qual a expectativa de crescimento para 2009 e qual a projeção de crescimento da sua empresa em particular?
José de A. Barcellos: O segmento odontológico os números estão provando que vem crescendo muito. Hoje, as operadoras vêm estudando o cenário. É bom citar que eu faço parte da diretoria do Sindicato Nacional da Odontologia de Grupo e nós temos adotado estratégias rumo a esse avanço. Hoje, falando em operadoras, nós até pensamos em um número ousado, por volta de 80% a 90% da carteira para o próximo semestre. Eu tenho uma projeção, falando de minha empresa, de crescimento de 120% até novembro deste ano, da minha carteira de clientes. Mesmo no mercado como um todo, a perspectiva é a mesma, apesar da crise econômica. Isso porque, como o custo muito é baixo, por parte da empresa que faz a contratação compulsoriamente, como é um benefício para o funcionário, ela vai preferir a odontologia.
Nelson Tucci: As pessoas passaram a descobrir um “plus” interessante para oferecer a seus empregados, e nesse vácuo vocês estão crescendo um crescimento extraordinário. Deve ser um dos maiores crescimentos da economia, de forma setorial.
Márcia Raposo: Você está falando de uma carteira de quantos anos, de 10 anos? Referindo-se ao crescimento de 90% do mercado de odontologia, ele está baseado em uma carteira de quantos anos? Deve ser o recorde histórico…
José de A. Barcellos: Em relação às operadoras, estamos falando de 20 anos. A coisa aconteceu de 2002 para cá, e há três anos o crescimento foi uma coisa violenta. Porque justamente eles estão procurando a odontologia como um custo-benefício interessante.
Nelson Tucci: Dá para a gente localizar geograficamente esse crescimento? Já que falamos muito do Estado de São Paulo, como está a região metropolitana, o litoral? Onde existe um foco maior de crescimento e de perspectiva?
José de A. Barcellos: Crescimento há em todas as regiões. A Baixada Santista, por exemplo, vem crescendo muito, e a nossa região “das sete cidades”, como nos referimos ao ABC, além de Guarulhos, Osasco e a capital. A tendência é aumentar mais, especialmente por meio de parcerias, como as que mantemos com associações, sindicatos e prefeituras.
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Fonte: ASSPREVISITE / PANORAMA BRASIL